A personagem Nina é uma bailarina, a historia já atrai por esse motivo; remete a uma ideia de glamour, luxo, erudição e coisas que atraem espectadores que buscam nos filmes as realidades que são distantes de si. Mas Nina poderia ser de qualquer outro oficio para sofrer de frustração, ansiedade, e todas as coisas que são da realidade dos espectadores. O fato de Nina ser bailarina só compõe o visual para o filme, a historia é contada com todo o floreio de um balé e também toda dramaticidade e técnica, assim a historia e o meio pelo qual é contada faz relação uma com a outra.
No inicio do filme, encontramos uma mulher adulta vivendo na atmosfera de uma criança, seu quarto, suas motivações, suas estrategias e seus relacionamentos. As pessoas em quem Nina se espelha, essa palavra é bem importante então vou repeti-la: espelha, variam ao longo da trama e sua primeira musa é a musa que todos temos em algum momento da vida, que é a própria mãe.
A mãe de Nina claramente convive com muitas frustrações próprias de si que a trama não apresenta a trajetória, mas é evidente o desejo dela de realizar em Nina tudo que não pode realizar por si só, seja la qual foi o motivo. Bem, a unica frustração que é aberta no dialogo das duas é sobre nunca ter conseguido ser protagonista nas peças de balé por estar gravida, obviamente de Nina. Talvez seja somente essa mesmo, só que a forma como a mãe lida com a filha é uma relação doentia, com uma roupagem altruísta e digna. Ela não apenas quer sua filha como uma grandiosa bailarina, mas a deseja eternamente dependente do relacionamento que possuem, Nina é uma criança no corpo de uma adulta por motivo de sua mãe sentir a necessidade de ser necessária, sem Nina ela é apenas uma ex bailarina sem prestigio algum. E conforme Nina vai sendo pressionada a agir como uma adulta, seu fascínio pela mãe some.
A segunda musa de Nina, é Beth. A princesinha de seu mentor, a bailarina que sua mãe jamais se tornou, uma mulher com toda a gloria e esplendor da fase adulta. Beth também tem muitas frustrações pessoais que não se apresentam integralmente na trama, ela está ultrapassada, há alguém melhor, não é mais necessária, é enferma. Todos se esquecem de Beth, mas Nina deseja encarna-la, ser uma Beth melhor que a própria já foi. Começa se espelhar na bailarina experiente para alcançar as próprias conquistas, não conseguiu ser cisne branco e negro conforme o mentor pediu pela técnica, tenta através do corpo, sedução, mostrar que possui toda qualidade necessária para o papel, como bailarina e como pessoa, o clássico eu mereço isso. Nisso usa joias, perfumes, maquiagens, tudo que conseguiu possuir materialmente de Beth, como se vestisse dessa princesinha amada para mostrar a "verdadeira Nina".
Se o rigor da mãe, a sensualidade de Beth não a torna hábil para o papel, Nina encontra sua terceira musa: rebeldia, inspirada em Lily, uma forasteira muito talentosa que é novata na companhia, porem mais veterana nas sensações cotidianas.
É muito interessante como ao longo da historia literalmente o figurino de Nina vai mudando, começa branco, rosa, preto... ela literalmente vai se transformando como pessoa, vai deixando se mostrar as suas outras faces. Tudo em prol de um único objetivo, se mostrar digna para o papel e alcançar a perfeição.
Desde o inicio Nina mostra que não transita muito bem entre o que é alucinação e o que realmente acontece, sua psicose fica cada vez mais intensa, obscura, violenta, todas suas musas passam ser suas inimigas, seu mentor passa ser seu inimigo. Ela volta sentir a criança indefesa e amedrontada em si, e ao mesmo tempo encontra uma energia transformadora que faz de si a grande musa; um espelho de todas suas inspirações e seus desejos inclusos na própria percepção do próprio ser. Esse é o seu momento.
Todo o sentimento controverso, toda alucinação, todo fracasso e toda gloria, finalmente atingem seu clímax, e justamente com um fragmento de espelho atravessado em sua rival, em si mesma. Nina não precisa mais se espelhar em ninguém, não tem mais quem temer, nem provar nada a ninguém, atinge seu objetivo e sua jornada termina.
Em todas as relações das personagens existe toxicidade e balsamo, coisas boas e ruins aparecem em todos os momentos com todos indivíduos, dependendo da interpretação de cada um que se consegue o rotulo de cisne branco ou negro. Nina se deixou levar por seus devaneios durante de uma busca do auto conhecimento, nunca foi as duas personagens e nunca se deixou ser apenas uma.
Perfeito seria ser cem por cento cisne branco ou cem por cento cisne negro, quando é desafiada a ser as duas coisas, acontecem todos os impasses. Na realidade ninguém é perfeitamente puro, mas tentamos ser, tentamos encontrar culpados pelos nossos fracassos, porque o peso de ter as duas existências em si é muito doloroso.
Constantemente buscamos aprovação por nossos atos, buscamos aplausos que as vezes não serão ouvidos, nos machucamos nos enchendo de mascaras para dançar conforme as musicas que tocam ao redor. Nem sempre chegamos onde gostaríamos e mesmo quando isso acontece sempre há uma sensação de que não fomos perfeitos.
Pensar sobre isso não é algo suave, aceitar as próprias derrotas não é simples. Precisamos constantemente nos manter ocupados para fugirmos de nos mesmos, esquecer por um tempo as dores que foram geradas pela própria existência, adiamos nossas dores e depois nos cobramos de nunca termos nos curado, ou mesmo sentir intensamente essa dor. Seja qual papel que vai se interpretar, é importante buscar a perfeição sim, mas nunca fazer disso o combustível que te mantem vivo.